Prólogo

Numa tarde, como outra qualquer, peguei minha bicicleta e pedalei cerca de um quilômetro até a casa da minha irmã. Bati no portão, com o coração acelerado. O imenso portão correu sozinho para o lado e revelou na garagem a minha irmã, minha mãe e minha sobrinha. Enfileiradas, até parecia que esperavam pelo meu anúncio. Adentrei ofegante e apoiei a bicicleta na parede para segurar a Duda no colo. Ela tinha quase dois anos de idade, ainda não falava, mas abriu um largo sorriso quando a peguei nos braços.

Foi nesse dia que contei para elas de minha jornada. Eu disse que ficaria por um ano viajando por alguns países da América do Sul, que largaria o emprego, que venderia tudo o que eu tinha e que mergulharia nesse novo estilo de vida. E, depois de suas primeiras reações, contei que faria tudo isso em cima de uma bicicleta. 

No início, os medos, inseguranças e o instinto protetor que tinham sobre mim, fizeram com que elas entrassem em pânico. Foi difícil responder as dezenas de perguntas naquela tarde. Enquanto a minha irmã abordava questões práticas do dia a dia, minha mãe fazia silêncio. E minha sobrinha tentava arrancar os meus óculos. As minhas respostas não satisfaziam seus corações. Eu estava partindo, e elas demoraram para entender a minha decisão.

Alguns meses depois, no dia 24 de janeiro de 2022, eu saí sozinho para viajar o mundo de bicicleta. Levantei-me naquela manhã, coloquei tudo o que eu tinha em meus alforjes, me despedi do meu cunhado, da minha mãe, da minha irmã e da minha sobrinha e lancei-me no escuro. Aquela segunda-feira foi o dia mais difícil da minha vida. Um acúmulo de experiências e referências de anos e anos culminavam em uma revolução interna. Rompi um pacto social.

Eu levava comigo uma cozinha, ferramentas para a bicicleta, roupas para todas as estações, barraca, saco de dormir, isolantes térmicos, medicamentos e comida. Era tudo o que eu precisava para viver e tudo o que eu tinha. Era pouca coisa. Eu teria que aprender a levar uma vida desapegada. Subi na Judit, minha bicicleta, e parti de minha terra natal, no interior de Goiás, para uma aventura sem data para acabar. Fui com pouco dinheiro e sabia que logo teria que começar a me virar para manter o sonho. 

Pedalei mais de mil e quinhentos quilômetros em direção ao Atlântico, somente com a força das minhas pernas. Saí de Goiás, cruzei o Triângulo Mineiro e entrei em São Paulo. Atravessei todo o estado até chegar no litoral paulista. O garoto do interior goiano chegava de bicicleta na praia, em Cananéia. Após meses em uma jornada solitária, pedalando por asfalto e chão de terra batida, decidi cruzar para o estado do Paraná de uma maneira diferente, por ilhas. Este livro narra exatamente esse período, quando eu teria que depender do clima e de caronas de barqueiros e pescadores locais para me locomover pelo mar.

Acumulei histórias e passei por situações que nunca imaginava passar. Tive dias de glória e dias de muito sofrimento. Os quilômetros me trouxeram cenários incríveis e pessoas maravilhosas. Renovei minha esperança na humanidade em cada metro que avançava. Fui ajudado e ajudei. Tive dias memoráveis, dias que não vão me abandonar nunca. Fiz amigos e vi mais coisas do que em 29 anos de vida. As semanas eram intensas, exaustivas e renovadoras. Vi biomas esmagados pelo progresso, trabalhadores e trabalhadoras de suor, pessoas sofridas e com histórias pesadas. Vi o que era real. Vi o que não me mostraram, mas o que busquei.

Este livro foi escrito enquanto ainda estava viajando. Ele foi escrito para viajar, para bater asas. Suas páginas foram digitadas vagarosamente enquanto eu rasgava a nossa América Maior, ziguezagueando entre desertos, rodovias, cordilheiras, vulcões e gigantescas montanhas congeladas. Respeitei os meus escritos e relatos pessoais dos dias aqui narrados, e tentei manter os sentimentos fundadores daquele período. Conto neste livro sobre vinte e quatro horas que vivi intensamente. Prepare-se para uma narrativa crua, direta e verdadeira de um menino que viajava para dentro de si, mesmo sem saber.

As próximas páginas falam de solidão, liberdade, medo e vento. Vi pelicanos de sangue, enfrentei ondas gigantes em voadeiras pequeninas, cruzei uma praia deserta pedalando sozinho, entrei em um barco de camarões que ficou à deriva, vi tormentas do mar e tormentas internas, fiz amigos e quase perdi o meu chapéu. 

Espero que esse fragmento te inspire a tentar viver como você quer viver. A buscar o seu próprio caminho. A abraçar as suas ideias com sangue. Seja lá qual for a razão que te faça mover, se faz sentido para você, já vale a pena uma tentativa honesta.

 

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Este livro foi escrito e publicado de maneira independente, com muito carinho e cuidado. Espero que gostem!

 

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